Educação Clássica e Charlotte Mason – Parte 3: Resgatando Pedras da Educação Clássica

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E nós – que aqui estamos, no início do século 21, buscando construir nossa filosofia educacional cristã – para onde devemos ir? Quando olhamos para a educação ao nosso redor, ficamos frustrados com os resultados das inovações e promessas da educação moderna, progressista e construtivista. As “torres de Babel” que vemos nessas escolas e livros didáticos são como prédios inacabados, lustrados, coloridos e enfeitados por fora, mas quando os testamos vimos que são construídos de papelão e MDF, e queremos algo mais sólido para oferecer aos nossos filhos. Automaticamente nos voltamos para as escolas tradicionais que ainda podemos encontrar, com suas pedrinhas mais sólidas, que ajudaram a formar nossos avós, pais e até mesmo alguns de nós. Mas para os nossos filhos… desejamos que eles nos superem, que vão além de nós, que recebam algo que sabemos que existe, mas que não tivemos…

Encontrando as Pedras Clássicas

Então, ouvimos falar, pela voz de Dorothy Sayers aos meados do século 20, sobre o monte de pedras da educação clássica, e de como precisamos de pedras assim para solucionar os problemas da educação de hoje. Mas Ai! Só pensar no trabalho e na força que será ir até aquelas ruínas soterradas, cavar entre os escritores clássicos, achar boas pedras, selecionar o que é bom e carregar para fora dos escombros – isso nos desanima, especialmente quando não fomos preparados fisica e intelectualmente para a fortitude exigida para a tarefa, e ainda mais quando entendemos que esse trabalho todo só construirá uma de nossas colunas, a acadêmica, e talvez um pouco da coluna moral. Na realidade, encontrar as pedras que reconstruiriam o templo original nem seria tão dificil – e alguns estudiosos clássicos ou católicos têm buscado fazer isso – quanto transformá-lo num prédio que sirva para a glória do Deus vivo e que seja útil para nossos dias. Mas, como crentes, temos esse compromisso inegociável com a glória de Deus e então tememos tanto a educação clássica pagã como a medieval e católica por sua idolatria, orgulho e outras faltas que já mencionamos.

E quanto àqueles crentes e líderes reformados e puritanos, como Calvino, Lutero, Melânchton, ou os grandes pais cristãos da nação norte-americana, e os demais pensadores cristãos dos séculos seguintes, que sabemos terem feito uso das grandes pedras clássicas… Será que eles não podem nos ajudar em nossa construção educucacional cristã? Sem dúvida eles nos deram importantes princípios teológicos, que preencheram nosso alicerce com base naquela pedra angular que possuímos. Alguns até esboçaram e construíram as colunas de uma educação verdadeiramente cristã, mas infelizmente eles não nos deixaram plantas e edifícios muito claros. Sabemos que eles usaram das grandes pedras clássicas no seu currículo, que eram os melhores materiais educacionais acadêmicos disponíveis no seu tempo. E temos testemunho de que mantiveram o caráter piedoso e cristão da educação e formaram grandes líderes com base no ensino da Palavra de Deus e das suas doutrinas. Mas o “como” eles fizeram isso permanece um tanto misterioso para nós porque eles ocuparam-se principalmente com a área teológica e não tiveram o tempo para formular e nos deixar compêndios educacionais. E, ainda que o tivessem feito, a sua construção, nos pontos práticos, seria adequada para os seus dias, mas não necessariamente para os nossos.

Resgatando as Pedras Clássicas

Alguns poucos educadores corajosos têm tentado penetrar nas antigas ruínas dos clássicos pagãos, e especialmente dos cristãos clássicos, e hoje temos formulações como “A Mente Bem Treinada”, de Susan Bauer e Jessie Wise, que propõe um resgate da educação clássica secular para os nossos dias; o “Ensinando o Trivium”, do casal Bluedorn, que busca oferecer para a coluna acadêmica uma educação cristã-reformada, com pedras clássicas como as que encontramos na academia de Genebra, e a “Educação por Princípios” que tenta resgatar os princípios cristãos e cívicos da educação dos pais fundadores dos EUA.

Para quem só tem visto construções de papelão, as pedras da educação clássica impressionam e tem atraído pais e professores, especialmente quando comparadas à fraqueza da educação atual. Quem deseja algo melhor do que o fracasso educacional que temos hoje é automaticamente inclinado e impressionado com a solidez de pedras clássicas como: formação sólida nas letras, gramática e literatura; ensino da lógica e da compreensão e análise de textos; memorização de material essencial; capacitação para sistematizar e relacionar fatos; habilidade de se expressar de maneira eficaz e bela; formação de pessoas com capacidade de liderança, altos ideais e vidas influentes; uma educação que exige trabalho duro, que prepara alunos para aprenderem por conta própria, e que dá um ensino individualizado e rigoroso; uma formação que pode ser feita em casa e com os melhores livros ou tutores; um método mais focado, que dá aos alunos ferramentas e habilidades de conhecimento e que não divide o ensino em séries, mas repete o conteúdo educacional em três níveis, cada vez mais aprofundados e adequados à fase de desenvolvimento da criança; um menor número de disciplinas e disciplinas diferenciadas como gramática, lógica, retórica, latim, teologia; materiais didáticos diferenciados, como livros vivos, livros-textos mais conteudistas, sistemáticos, que incentivem auto-aprendizado, que apresentem o assunto com solidez e ofereçam exercícios objetivos, analíticos e produtivos. Ah, como os pais e educadores cristãos atuais têm se encantado com a educação clássica!

Limpando e Selecionando Pedras Úteis

Mas precisamos lembrar nossos educadores cristãos que, para poderem usar dessas pedras, será preciso, primeiro, limpá-las das sujeiras que normalmente se encontram nos escombros: precisamos primeiro discernir os perigos inerentes à educação clássica: 1) o perigo do paganismo, ou seja, da mistura indevida da filosofia pagã com a bíblica, como aconteceu com o escolasticismo; 2) o perigo da idolatria da razão e do orgulho intelectual; e 3) o perigo da distorção pessoal de elevar a razão sobre outras áreas do ser humano.

Em segundo lugar, eles precisarão redefinir a própria educação clássica, que não pode ser o retorno do neopaganismo nem do estudo clássico rigoroso católico-medieval. Para podermos, como cristãos, usar a educação clássica, precisamos falar de uma educação cristã no estilo clássico, como aquela oferecida pelos reformadores como Calvino na Academia de Genebra, ou nas universidades dos puritanos. Como eles justificaram usar daquelas pedras? Bem, elas eram o melhor material educacional disponível no seu tempo para a formação acadêmica dos alunos. Mas eles entenderam que precisavam primeiramente estabelecer as verdades bíblicas como seu fundamento educacional, seja inserindo a Bíblia no currículo como o clássico dos clássicos, seja estudando e interpretando todos os assuntos à luz das verdades bíblicas, que eram seu fundamento.

Depois de examinarem as pedras da educação clássica, e de jogar fora mutas delas que não se coadunavam com o ensino bíblico, eles mantiveram aquelas pedras úteis das sete artes liberais que, embora fossem todas tendentes à formação intelectual, colaboravam para o estudo sistemático e organizado das verdades de Deus, algo que precisamos desesperadamente em nossos dias. Como nos ensina Veith: “Em meio a um contexto de um mundo pluralista e relativista, os cristãos precisam reaprender a pensar em termos de verdade e de doutrina e não em termos de experiência ou vontade ou interesses particulares.” Elas também se alinhavam aos interesses cristãos quanto à necessidade de memorizar (conhecer fatos), de estudar as línguas e gramática para aquisição do conhecimento, e de aprimorar o pensamento (compreeender os fatos). De fato, a educação clássica faz um trabalho excelente de desenvolver as capacidades da mente e de usar ferramentas úteis para repassar conhecimentos aos alunos, e esse é um dos objetivos primordiais da educação cristã: preparar a mente da criança para receber, assimilar e organizar o conhecimento de verdades. Os cristãos clássicos reconheciam que o estudo sistemático e intelectual, que pode ser muito útil para o estudo do latim, da lógica, da teologia, da retórica, da história, da ciência e da matemática, não é o único nem o melhor meio de se trabalhar os sentimentos, a vontade, o caráter, as atividades manuais, os relacionamentos pessoais, etc. Mas os educadores cristãos clássicos antigos deixavam essas outras áreas para serem trabalhadas mais diretamente pela família, igreja e sociedade, e somente indiretamente por meio dos textos e habilidades estudados. Assim, vemos no decorrer da história muitos teólogos e grupos de cristãos utilizando-se dos métodos clássicos na educação das crianças e sendo muito bem sucedidos na sua formação intelectual, a exemplo dos puritanos, os quais se tornaram exemplares também na piedade e no compromisso com a verdade de Deus, o que nos mostra que a excelência acadêmica clássica e o ensino no temor do Senhor podem andar juntos.

Continua…

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