Capítulo 3 O presente de Mary para Amélia

Em quase todos os países, o mês de maio é notável por seus encantos, o que justifica a linguagem do poeta ao dizer:


Doce mês,
Se não o primeiro, o mais prezado, do ano

Foi no início do mês encantador que Mary foi a um bosque da vizinhança para cortar alguns ramos de salgueiro e galhos de aveleira. Ela os colheu para seu idoso pai usá-los, pois, quando não estava ativamente trabalhando no jardim, ele ocupava seu tempo fazendo cestas ornamentais de vários tipos – pois James era um homem trabalhador. Ele sabia muito bem qual era o seu dever gastar qualquer tempo que Deus tinha dado a ele para “remir” e pelo qual ele sabia que precisaria prestar contas. Ele fazia questão de nunca ter tempo ocioso, pois o trabalho é essencial para a felicidade e utilidade. Oh, pense no ganho que haveria para a causa de Cristo se nós “juntássemos os fragmentos (de tempo) que nos sobram, para que nada fosse perdido” e era nesse tempo, enquanto estava ocupado, que Mary lia para ele no precioso livro de Deus, ou ele falava para ela, as coisas acerca de sua alma imortal.

Enquanto Mary estava no bosque, colhendo material para a produção das cestas de seu pai, ela achou algumas belas espécies de lírio do vale e colheu o suficiente para fazer dois buquês, um para seu pai e um para ela mesma. Quando ela terminou seu trabalho, ela voltou para casa por um caminho mais rápido, que passava pelo meio de um pasto, e no meio do caminho, encontrou a Condessa de Eichbourg e sua filha, Amélia, que estavam fazendo uma caminhada vespertina. Mary raramente tinha visto as duas, pois elas viviam a maior parte do tempo na cidade, porém estavam agora passando uns dias no castelo. 

“Oh, que lindos lírios do vale!” – exclamou a jovem condessa, que era apaixonada por flores, e preferia ainda mais as silvestres do que qualquer outra.

Ao ouvir essa exclamação, Mary deu um buquê para cada uma das moças. Elas os receberam com prazer e a condessa, pegando uma bolsa de seda ricamente bordada com ouro, ofereceu dinheiro a Mary, o qual ela se recusou a aceitar.

“Oh, não, não, minha senhora”, disse ela, “eu não posso aceitar dinheiro pelas minhas flores. Meu pai e eu temos recebido muitos benefícios do Conde. Permita, por favor, que essa pobre moça tenha o prazer de oferecer a vocês esse pequeno presente de graça”. As palavras de Mary eram com tanta graça e simpatia que elas não puderam recusar. 

A Condessa sorriu agradavelmente e disse “Bem, mocinha, você seria tão gentil de trazer, de vez em quando, um buquê de lírios do vale para a minha filha no castelo?” Mary prometeu que o faria e todas as manhãs, enquanto os lírios do vale floresciam, ela levava um lindo buquê para o castelo.

Algumas das circunstâncias mais importantes da nossa vida vem dos eventos que são aparentemente os mais insignificantes. Isso foi verdade no caso de Mary pois esse encontro acidental marca o que há de mais profundo e doloroso nessa pequena história. Contudo, Deus governa sobre todos os eventos e está absolutamente provado que “todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus”. Das regulares visitas de Mary ao castelo, para levar seu buquê de flores matinal, como era de se esperar, uma intimidade cresceu entre ela e Amélia, pois elas eram praticamente da mesma idade e tinham muitos gostos parecidos, especialmente o seu mútuo amor pelas flores.

O aniversário de Amélia estava se aproximando, e Mary decidiu fazer alguns pequenos presentes da natureza para ela, mas, como já tinha dado muitos buquês de flores, ela queria pensar em algo novo. Durante o inverno anterior, o seu pai tinha feito muitas cestas artesanais, todas muitíssimo elegantes, contudo, a mais bonita foi dada à própria Mary. Nela ele tinha feito o desenho da vila, e esse tipo de trabalho era de perfeição marcante. Mary decidiu encher essa cesta com flores e dar à jovem Condessa como seu presente de aniversário. Seu pai prontamente deu sua permissão e, para embelezar ainda mais a linda cesta, ele colocou o nome de Amélia de um lado e o brasão do Conde do outro.

Chegou o dia tão esperado, e de manhã cedo, Mary colheu as rosas mais novas, os melhores cravos, as flores mais rosas e outras das mais lindas cores. Ela colheu alguns ramos verdes, cheios de folhagem e arrumou as flores na cesta, tão entremeadas com as folhas verdes, que todas as cores, ainda que perfeitamente distinguíveis, estavam doce e delicadamente misturadas. A cesta foi envolta com uma alegre guirlanda, feita de botões de rosas e musgos, e o nome de Amélia podia ser lido claramente, emoldurado com uma coroa de não-me-esqueças. Todo o aspecto da cesta era realmente de uma beleza incomum.

Mary então entrou no castelo com seu presente, que ela deu à Condessa Amélia, desejando o melhor para a felicidade de sua jovem amiga do fundo de seu coração, tanto aqui, como na vida porvir. A jovem Condessa estava sentada em sua penteadeira, atrás dela estava sua ama, ocupada fazendo um penteado para a sua festa de aniversário. Amélia ficou encantada com a cesta e recebeu o presente com uma alegria excepcional e ela mal podia encontrar palavras para expressar o seu deleite, enquanto observava as lindas flores tão bem arranjadas na cesta. 

“Querida Mary”, ela disse, “você é muito gentil. Você deve ter assaltado o seu pequeno jardim para fazer um presente tão rico e, quanto à cesta, eu nunca vi nada tão primoroso em toda a minha vida. Vem, vamos mostrar para minha mãe”.

Ela tomou Mary carinhosamente pela mão e levou-a para cima, para o quarto da Condessa.

“Realmente”, ela disse, “essa cesta, com essas flores ainda molhadas com o orvalho, é realmente primorosa. É uma figura perfeita e se iguala aos esforços dos mais experientes artistas. Ela faz jus ao bom gosto de Mary, mas ainda mais à gentileza do seu coração. Espere um momento, pequena” – ela disse a Mary, enquanto fazia um sinal para que Amélia a seguisse para outro cômodo. 

“Amélia”, disse a Condessa, “Mary não pode ir embora sem a devida retribuição. O que você tem para dar a ela?”

“Eu acho que” – disse Amélia depois de refletir um pouco – “um dos meus vestidos seria o melhor, por exemplo, se a senhora deixar, minha querida mãe, aquele com flores vermelhas e brancas, num fundo verde escuro. Ele é praticamente novo, eu usei só uma vez. Ele está um pouco pequeno em mim, mas ficaria perfeito na Mary, e ela pode ajustá-lo como quiser, ela tem muito bom gosto. Se não for, assim, demais…”

A Condessa a interrompeu: “Com certeza não é demais. Quando você quer dar alguma coisa a alguém, deve ser algo útil. O vestido verde com flores será muito adequado para a menininha das flores”.

A Condessa então voltou para seu quarto com Amélia, e olhando gentilmente para Mary, ela disse: “Vão, minhas queridas, levem essa adorável cesta e cuidem bem das flores, para que elas não murchem antes do jantar. Eu quero que os convidados admirem a cesta que também será o enfeite mais lindo na mesa. Tchau, pequena Mary, eu deixarei que Amélia agradeça a você pelo seu presente”.

Amélia correu para o seu quarto com Mary e disse para Juliette, sua ama, trazer seu vestido.

“Você quer usar o vestido hoje, vossa senhoria?” – perguntou a ama.

“Não”, disse Amélia, “eu quero usá-lo de presente para Mary”.

“Dar para Mary!”, exclamou Juliette, num tom de surpresa, “a Condessa sabe disso?”

“Traga o vestido”, disse Amélia, “e não se preocupe com nada”.

Juliette se virou, para esconder o seu rancor e saiu com o rosto ardendo em ira. Ela abriu o guarda-roupa com um puxão e pegou o vestido da Condessa. “Eu queria ser capaz de rasgar ele em pedaços”, pensou a menina má. “Essa Mary já ganhou o favor de minha jovem senhorita, e agora, ela rouba de mim esse vestido, porque ele seria meu quando Amélia não o quisesse mais. Eu queria arrancar os olhos daquela garotinha. Mas, eu vou me vingar”. 

Que espírito perverso Juliette permitiu! Ela deveria ter ficado feliz com o bem feito a Mary, mas o coração de Juliette fez o que era errado – ela nunca deve ter ouvido a Bíblia e aquele pequeno acontecimento deu ocasião para que ela demonstrasse o seu mau temperamento. Abafando a sua ira, entretanto, ela voltou com um ar agradável e deu o vestido a Amélia.

“Querida Mary”, disse Amélia, “Eu ganhei hoje presentes muito mais caros do que a sua cesta, mas nenhum deles me deu tanto prazer. Veja esse vestido com flores; receba como sinal da minha afeição e leve as minhas lembranças para seu pai”. Mary então pegou o vestido, beijou a mão da jovem Condessa e foi embora do castelo.

Juliette, com ciúmes e raiva, continuou trabalhando silenciosamente. Ela teve muita dificuldade para conseguir terminar o penteado que estava preparando, e não pôde esconder totalmente sua raiva.

“Você está com raiva, Juliette?” perguntou a jovem Condessa. 

“Seria muito tolo”, disse Juliette, “estar com raiva só porque você foi generosa”.

“Você falou com muita sensatez”, se alegrou Amélia, “Eu espero que você sempre seja tão sensata assim”.

Mary correu para casa, toda alegre, mas o pai dela tinha muita prudência para sentir qualquer alegria com um presente assim. 

“Eu preferia muito mais”, ele disse, “que você não tivesse levado a cesta para o castelo, porém agora não dá para voltar atrás. Você não faz ideia do valor desse vestido, além de ser um presente daqueles que respeitamos tanto. Eu temo que isso faça outras pessoas ficarem com inveja de você, ou, ainda pior, que ele venha a encher o seu coração de vaidade. Tome cuidado, minha filha querida, para que você não caia nesses dois males. A modéstia e os bons modos são mais apropriados para uma mocinha do que os enfeites mais belos e caros. Pense mais na beleza interior do coração, do que no adorno do corpo exterior”.

Caro jovem leitor, cuidado com o carinho por vestidos. Estar arrumado de acordo com a situação em que você se encontra é o mais consistente com a vontade de Deus e o mais indicado para ganhar o respeito do mundo. Lembre-se de que aqueles que querem mostrar o exterior, tem sobre si um interior deformado como distinção. Muitos jovens se perderam por se permitirem o desejo por roupas, e muitos jovens crentes em Cristo, nessa mesma rocha, naufragaram na fé. Mães, não permitam isso. Aprendam a entender a verdadeira beleza da simplicidade.

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