Nota da Tradutora:
Tomei a liberdade de dividir esse capítulo em duas partes, e introduzi alguns subtítulos, com vistas a uma apresentação mais didática dos pontos tratados pelo autor, e farei o mesmo com o próximo capítulo. Assim, o assunto da Autoridade Materna terá quatro partes, que disponibilizarei em quatro postagens, sob os seguintes títulos:
Parte1: A Importância da Obediência
Parte 2: Estabelecendo o Hábito da Obediência
Parte 3: Lidando com Situações de Confronto e com Diferentes Disposições da Criança
Parte 4: A Justiça e a Bondade na Disciplina
A Mãe no Lar. John Abbot
Capítulo 2-Autoridade Materna
Até o momento, eu tenho buscado mostrar à mãe como a sua felicidade depende do caráter bom ou mal de seus filhos. As suas reflexões próprias têm, sem dúvida, impressionado esse assunto profundamente em seu coração. A questão que provavelmente surgiu na sua mente, enquanto você lia o primeiro capítulo, é: “De que maneira eu devo governar os meus filhos, com o fim de assegurar a virtude e a felicidade deles?”. Essa é a questão que eu buscarei responder a partir de agora.
Princípio
A obediência é absolutamente essencial ao governo familiar apropriado. Sem ela, todos os seus demais esforços serão em vão. Você pode orar por e com os seus filhos; você pode se esforçar para instruí-los na verdade religiosa; você pode ser incansável em seus esforços para fazê-los felizes, e para conseguir a afeição deles. Mas se eles tiverem o hábito da desobediência, as suas instruções se perderão, e o seu trabalho será em vão. E por obediência, eu não me refiro ao ceder apático e vagaroso à ameaças repetidas, mas à aquiescência imediata e alegre às ordens dos pais. Tampouco é suficiente que a criança venha a ceder a seus argumentos e persuasões. É essencial que ela se submeta à sua autoridade.
Exemplos
Vou dar-lhes um exemplo para ilustrar essa observação. A sua menininha está doente; você vai levar-lhe o remédio que foi prescrito para ela, e isso ocasiona o seguinte diálogo:
“Olha, filhinha, eu tenho um remédio para você.”
“Eu não quero tomar esse remédio, mãe”.
“Ô, filhinha, toma o remédio, sim, que ele vai fazer você se sentir melhor.”
“Não vai não, mãe; eu não quero isso.”
“Vai sim, minha filha; o médico disse que sim.”
“Mas ele tem um gosto horrível, e eu não quero tomar.”
A mãe continua com suas persuasões, e a criança persiste em sua recusa. Depois de um longo e cansativo conflito, resta à mãe ou jogar o remédio fora, ou recorrer à compulsão, e forçar a criança a engolir o remédio amargo. Assim, ao invés de recorrer à sua autoridade própria suprema, ela está apelando para a razão da criança. E, sob essas circunstâncias, a criança, é claro, recusa-se a se submeter.
Não muito tempo atrás, outra mãe, sob circunstâncias similares, sem conseguir persuadir a sua criança a tomar o remédio, e sem ter resolução suficiente para compeli-la, jogou o remédio fora. Quando o médico veio visitar, ela ficou com vergonha de admitir sua falta de governo e, portanto, não contou para o médico que o remédio não foi dado. O médico, encontrando a criança pior, deixou outra prescrição, supondo que o remédio prévio havia sido administrado apropriadamente. Mas a criança não tinha a menor intenção de ser convencida de que ela precisava tomar a dose enjoativa, e os esforços renovados da mãe foram inúteis. Mais uma vez, essa mãe, afetuosa e imprudente, mas cruel, jogou fora o remédio, e a febre veio a arder cada vez mais alta nas veias da criança. Mais uma vez o médico retornou, e ficou surpreso de descobrir que seus remédios foram ineficazes, e que a pobre criança sofredora estava à beira da morte. A mãe, quando foi informada de que a criança estava para morrer, em sua agonia, confessou o que havia feito. Mas era tarde demais. A criança faleceu. E você acha que essa mãe olhou para aquele corpinho pálido com uma agonia normal? Você acha que nunca passou pela sua mente que foi ela quem destruiu a sua criança? Os médicos lhe dirão quantas crianças já perderam suas vidas assim.* Estando desacostumadas à obediência quando estavam com saúde, elas se tornaram ainda mais avessas a ela quando doentes. Os esforços que são feitos para induzir uma criança teimosa a tomar remédio, frequentemente produzem uma agitação tão grande e capaz até mesmo de desfazer totalmente os efeitos do remédio; e assim a mãe é com frequência deixada a chorar sobre a sepultura de sua criança, simplesmente porque ela não ensinou aquela criança a obedecer.
O Dilema: Explicar ou Obrigar?
Sem dúvida é o dever dos pais convencer os seus filhos da razoabilidade e da propriedade de seus requerimentos. Isso deve ser feito para instruí-los, e para familiarizá-los com a obrigação moral. Mas sempre deve haver autoridade suficiente para impor obediência imediata, quer a criança possa ou não ver a razão do requerimento. De fato, é impossível governar uma criança por mero argumento. Haverá muitos casos em que ela será incapaz de ver a razoabilidade da ordem; e com frequência os seus desejos serão tão fortemente opostos ao dever, que todos os esforços para convencê-la serão em vão. A primeira coisa, portanto, a ser buscada, é trazer sua criança à perfeita submissão. Ensine-a que ela precisa lhe obedecer. Algumas vezes, dê as suas razões; outras vezes, não. Mas que ela entenda perfeitamente que ela deve fazer o que é mandada. Acostume-a a aquiescer à sua vontade imediatamente e de bom grado. Isso é obediência. E isso é absolutamente essencial ao bom governo familiar. Sem isso, a sua família irá apresentar uma cena continuada de barulho e confusão; o trabalho de criar os seus filhos será quase insuportável, e, com toda probabilidade, o seu coração será quebrado pela futura licenciosidade e ingratidão deles.
Para ilustrar mais completamente o que eu quero dizer com esse ponto de que nem sempre é melhor dar razões às crianças, permitam-me supor um caso. Um menino chega à sua mãe para pedir permissão para ir brincar na rua de tarde.
“Não, meu filho”, diz a mãe, “eu preferiria que você não fosse. Aqueles meninos da rua são ruins, e você vai aprender maus hábitos. Eu acho melhor você ficar em casa”.
“Mas, mãe, eu não acho que eles são meninos ruins. O William e o João estão lá, e eu não vejo por que eu não poderia ir.”
“Porque eles falam palavrão, e são mal-educados. Além disso, está frio, e eu acho que não seria agradável para você sair essa noite. Eu acho que você ficará muito mais feliz se ficar em casa conosco.”
“Então, mãe, se eles falarem palavrão, eu volto pra casa. É que eles vão ter o jogo que eu mais gosto, e eu queria tanto ir.”
Assim, surge uma discussão prolongada que provavelmente termina com a vitória do menino. A mãe não percebe que todos os seus argumentos são completamente anuladas pelo forte desejo do menino de gratificar a sua vontade, desejo este que o intoxica completamente. É perfeitamente vão, num momento desses, tentar convencê-lo. Ele está totalmente cego.
A Solução
Tomando o exemplo que acabamos de supor, o único caminho apropriado é a mãe dizer com mansidão, mas com firmeza:
“Não, meu filho, você não pode ir”.
“Porque não, mãe? Eu quero ir”.
“Eu não posso lhe dizer o porquê no momento. Eu vou conversar sobre isso com você outra hora.”
Então a mãe deve esperar até que o filho tenha passado uma tarde alegremente em casa, e logo antes dele ir dormir, quando a consciência dele está em paz, e a sua mente predisposta em favor do dever e da felicidade doméstica, ela então pode falar para ele a razão por que ela o mantém longe da rua e das cenas barulhentas e vergonhosas de tentação e de pecado que acontecem ali.
Que todos os pedidos como estes por gratificações pecaminosas ou perigosas sempre sejam decididos por autoridade, e não por persuasão, a menos, como foi sugerido acima, que você queira deixar o seu filho a decidir por si mesmo, a fim de que ele aprenda sabedoria pela experiência. Isso, contudo, deve ser feito muito raramente, e com muito cuidado; ou você irá descobrir que enquanto você estava querendo que ele ficasse enojado com os males do pecado, você acabou endurecendo a sua consciência para a sua culpa.
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*talvez o cenário não seja o mesmo nos dias atuais, quando é possível a hospitalização e administração intravenosa de medicamentos, mas talvez uma aplicação atual desse exemplo seja a tendência dos pais cederem à vontade da criança na sua alimentação, dando-lhe apenas o que ela gosta, como “fast food”, excesso de doces e de comidas processadas, etc., e os resultados dessas indulgências têm afetado de maneira grave, embora talvez mais lentamente, a saúde das crianças, o que tem sido comprovado pelo número crescente das diagnoses de câncer, diabete, obesidade patológica, entre outras coisas, em crianças e adolescentes.
Esse é o capítulo 2. Onde está o primeiro? Não consegui localizar…
É só clicar no tema "Educação no lar", no canto superior direito do site, que devem aparecer todas as postagens sobre esse assunto. 😉